quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Férias para meio ambiente


Ao transformar a natureza em atração, a atividade turística exerce impacto no meio ambiente, podendo provocar não só o esgotamento dos recursos naturais como também uma descaracterização cultural e desequilíbrio social na comunidade local, que recepciona os viajantes. Assim, se por um lado o turismo é um importante vetor para o desenvolvimento socioeconômico e cultural de um destino - uma vez que demanda obras de infraestrutura e gera empregos e renda -, é preciso buscar alternativas para minimizar seus possíveis efeitos negativos. Uma das soluções é a prática responsável dessa atividade - o chamado turismo sustentável, cujos fundamentos se resumem em eficiência econômica, justiça social e prudência ecológica. Ou seja, trata-se de desenvolver e manter a infraestrutura sem atitudes ofensivas ao ambiente, atendendo tanto às necessidades dos visitantes quanto da população local. No caso da hotelaria, um empreendimento sustentável é aquele que não só implementa ações focadas na redução do consumo de água, energia e produção de resíduos, mas que também ajuda a preservar o lugar e a cultura local, promovendo ações junto à comunidade e trazendo benefícios para a região.


A primeira premissa da sustentabilidade na hotelaria é que o estabelecimento que adota essas práticas é, necessariamente, mais lucrativo, uma vez que reduz a produção de lixo, o consumo de energia, de água etc.", garante Helenio Waddington, presidente da Associação de Hotéis Roteiros de Charme e dono do hotel Rosa dos Ventos, em Teresópolis (RJ). Um dos primeiros a abordar o tema no Brasil há 20 anos, quando só as universidades e a ONU falavam no assunto, as práticas adotadas por Waddington em seu hotel são exemplares. A começar pela recuperação da área em que está instalado. "Quando a fazenda foi comprada, em 1972, era uma área só de pastos para gado e a Mata Atlântica nativa tinha desaparecido completamente", lembra. "Nós cercamos a propriedade, colocamos placas proibindo a entrada de homens e animais e hoje, 40 anos depois, a natureza se regenerou totalmente, sem qualquer interferência humana, e toda a flora e fauna características da Mata Atlântica voltaram", comemora. Uso de energia solar, programas de reciclagem, horta orgânica e a organização de cursos de hotelaria básica para a população carente do entorno - com aulas de educação ambiental, agricultura orgânica e noções de higiene, civilidade e educação - são outras medidas sustentáveis praticadas no Rosa dos Ventos. Waddington também implantou outro projeto que serve de referência: o Programa de Indicadores Ambientais. Em funcionamento desde 2004, e com uma equipe de biólogos e engenheiros ambientais, faz um trabalho de campo que afere se os pontos-chave do Código de Ética e Conduta Ambiental da associação estão sendo implementados por seus 55 membros. Vários itens são analisados, como a racionalização do consumo de energia elétrica, o alcance da reciclagem, o nível de descentralização das responsabilidades de conduta ambiental do hotel e o envolvimento de seus funcionários, hóspedes, fornecedores, prestadores de serviço e da comunidade local. 


Desde outubro de 2012, o programa passou a ter também um aspecto educativo: por meio de convênios com faculdades das regiões em que os hotéis se encontram, biólogos e engenheiros ambientais recém-formados acompanham os colaboradores da associação e aprendem na prática esse trabalho. "Além de formar pessoas, levamos a cultura ambiental para locais onde a preservação ainda não é uma prioridade essencial para a população local", resume.

O VERDADEIRO DESAFIO

"Aos empreendedores que querem levantar essa bandeira e não sabem como começar, o ponto de partida é envolver a população do entorno no projeto. Se não houver esse engajamento, as chances de sucesso se reduzem". Foi com essa ideia na cabeça que Isney e Marcelo Monteiro, proprietários da Pousada Lagoa do Cassange, na Península de Maraú, na Bahia, conquistaram o respeito e a admiração da comunidade em que se instalaram em 1994. Percebendo a precariedade da educação na região, o casal improvisou uma escola para jovens e adultos dentro da pousada. É ali, em meio aos hóspedes que cochilam na rede e consomem o artesanato local, que as aulas acontecem. Quem deu uma mãozinha foi Giuliano Giovanni, pai de Isney, então professor aposentado, que voltou à ativa. "Quando se fala em sustentabilidade, as pessoas costumam se prender à questão ecológica de redução de lixo, desperdício e reutilização de detritos para compostagem quando, na verdade, o grande desafio é a integração social. O caminho é a relação com toda a comunidade", avalia o empresário Edgar Werblowsky, fundador da Freeway Ecoturismo e da Immaginare Turismo, que conhece o projeto de perto. "É uma troca muito poderosa", completa. Sobre isso, Waddington é bastante enfático: "Geralmente, a questão da gestão ambiental é tratada de cima para baixo; ela começa com os administradores e vai descendo até os funcionários da base do hotel. É o que chamamos de top down. Eu, pessoalmente, não acredito nesse tipo de sistema. Acho que o único jeito de dar certo é exatamente o contrário, o que chamamos de botom up. É descobrir qual é o impacto ambiental junto com o pessoal da base do hotel, tentar entendê-lo e, a partir daí, ir subindo na escala hierárquica, envolvendo todos, inclusive fornecedores e vizinhos", elucida. "Temos que despertar a autoestima do empregado de nível mais baixo; ele precisa achar que 'é o cara', perceber que é o ator mais importante de todo esse processo", exemplifica Waddington.


CARÁTER LOCAL

Em João Pessoa, o Verdegreen Hotel reúne vários atributos necessários a um hotel sustentável: tem coleta seletiva de lixo, aquecimento solar, sistema de ar-condicionado de baixo consumo, elevadores inteligentes, iluminação natural em toda a área social, reutilização da água de chuva e até com uma horta orgânica. Como se fosse pouco, o empreendimento também criou o programa Atitude Verde, que executa diversas ações voltadas à responsabilidade socioambiental. Por todos esses motivos, recebeu o prêmio de Hotel Sustentável do Ano no GUIA QUATRO RODAS BRASIL 2012. Outro bom exemplo é o Nau Royal, em Cambury (São Sebastião/SP), que, além de utilizar o mínimo possível dos recursos naturais, também adota a sustentabilidade como diretriz financeira, buscando parcerias que proporcionem vantagens econômicas para todos os seus fornecedores. Por isso, foi escolhido o hotel sustentável do ano no GUIA BRASIL 2013. Instalado no Parque Estadual da Cantareira, em São Paulo, o Unique Garden Hotel & Spa procura desenvolver nos funcionários a responsabilidade e a interação com o meio ambiente. Uma das ações que visam à redução de resíduos é o uso de um coletor que emprega sacos de 200 litros - uma vez preenchidos, eles são anotados em uma planilha que registra a quantidade usada, favorecendo o monitoramento e eventuais ações corretivas.

O material reciclado é doado para o centro comunitário Mara Siaulys, que desenvolve atividades educativas na comunidade do entorno.

EXEMPLOS INTERNACIONAIS

Fora do país, um bom exemplo vem do Jake's Hotel Treasure Beach, na Jamaica, onde os gestores criaram uma fundação para promover a educação, os esportes e garantir atendimentos de saúde de emergência na região. Dirigida por um conselho de voluntários da comunidade e financiada por subvenções, doações e pela venda de produtos, a Breds Treasure Beach Foundation recebe ainda 1 dólar de cada diária paga no hotel. Assim, ao longo de duas décadas, a instituição realizou projetos vitais para a sociedade local, entre eles a construção de 30 casas e seis salas de aulas.



Projetos assim também alavancam parcerias e podem trazer recursos empresariais para a comunidade. E se planejados antes do investimento, garantem qualidade ao processo de implementação e ao empreendimento. O visitante percebe isso pela forma com que é tratado pelos colaboradores. Afinal, quando o funcionário se sente parte do negócio, se orgulha e trabalha com dedicação, irradiando a sensação de alinhamento com o hotel. No estado de Nova York, o Lake Placid Lodge dá um exemplo diferente de integração com a natureza. Localizado no Adirondacks Park, cercado de montanhas e lagos, o hotel organiza atividades diversas como pescaria e canoagem, mas veta o uso de aparelhos eletrônicos dentro do estabelecimento. O Novotel Lausanne Bussigny (Suiça), do grupo Accor, passou por uma reforma que consumiu quase 12 milhões de euros mas deu ao hotel um sistema de reciclagem de água de chuva, outro que aproveita o calor de geladeiras, freezers e aparelhos de ar-condicionado para o aquecimento dos boilers, isolamento vegetal no telhado, uma lareira alimentada por bioetanol no lobby e um sistema de sensores de presença nos quartos que ativa e desativa lâmpadas e equipamentos elétricos. Isso só foi possível graças ao compromisso da rede com o planeta, que levou à criação dos departamentos de meio ambiente e de desenvolvimento sustentável, respectivamente em 1994 e 2002. 

Além disso, sob o slogan "Aqui, suas toalhas plantam árvores", o grupo tornou-se parceiro, em 2008, do programa mundial da ONU Plant for the Planet: Billion Tree Campaign. E lançou um projeto para financiar, até o final de 2012, o plantio de 3 milhões de árvores em sete países onde marca presença: Austrália, Brasil, Estados Unidos, Indonésia, Romênia, Senegal e Tailândia. Desde então a Accor já bancou o plantio de 1,6 milhão de mudas, sendo 412 mil delas na América Latina. De acordo com a coordenadora de desenvolvimento sustentável da Accor para a América Latina, Julia King, a adesão dos hóspedes brasileiros tem sido surpreendente. "Foram reutilizadas mais de 220 mil toalhas só no primeiro semestre de 2011 e as economias obtidas no serviço de lavanderia se reverteram no plantio de 47 mil árvores, transformando uma ação simbólica num benefício concreto", contabiliza. 

Além disso, desde 2009 a Accor investe em campanhas de comunicação e treinamento dos funcionários envolvidos no projeto. E também aposta nos escalões mais baixos do seu staf: no início deste ano, a empresa levou 20 arrumadeiras de alguns hotéis no Brasil para realizar o plantio simbólico de árvores no Parque da Serra da Canastra, em Minas Gerais, durante um fim de semana. Como bem resume Waddington, "é preciso integrar o homem ao contexto, pois não existe nada mais antiecológico do que a miséria".

- Gerar maiores benefícios econômicos para a população local e aumentar o bem-estar das comunidades receptoras, melhorando as condições de trabalho e de acesso ao setor.
- Envolver a população local em decisões que afetam sua vida.

- Criar contribuições positivas para a conservação da herança natural e cultural e para a manutenção da diversidade.

- Promover experiências memoráveis para os turistas, por meio de um contato mais significativo com os habitantes, e uma compreensão maior das questões culturais, sociais e ambientais do local.

- Ser culturalmente receptivo e interessado, o que gera respeito entre turistas e anfitriões e constrói relação de satisfação e confiança.

- Promover acesso fácil para pessoas portadoras de necessidades especiais.

OS SETE PECADOS

O que o seu hotel deve evitar, conforme relatório internacional da consultoria canadense Terra Choice Environmental Inc., especializada em meio ambiente

1. Custo ambiental camuflado - O rótulo destaca uma qualidade "verde" do produto, mas esconde outras características que podem representar uma perda ambiental maior.

2. Ausência de prova - Faltam dados provando que o produto é correto ambientalmente.

3. Incerteza - Quando o consumidor confunde significados. Alguns exemplos estão nas expressões "natural" (arsênio, urânio e mercúrio são naturais, mas venenosos) e "ecologicamente correto", que por si só não querem dizer muita coisa.

4. Culto a falsos rótulos - O produto transmite informação enganosa quando parece que tem um selo confiável e não tem - tipo trazer o desenho de um planeta fofo que só "enche linguiça" e confunde o consumidor.

5. Irrelevância - O rótulo destaca informações desnecessárias. Um exemplo é quando a embalagem diz que "não contém CFC" como se fosse um diferencial, sendo que essa substância já foi banida por lei há anos.

6. "Menos pior" - O benefício ambiental do produto é verdadeiro, mas esconde o impacto da sua indústria como um todo. Por exemplo, pesticidas que se apresentam como ecologicamente corretos.

7. Mentira - Quando a informação é falsa. O segmento de cosméticos e higiene foi o que mais apresentou apelos mentirosos.

CHECK-LIST PARA SABER SE O SEU HOTEL TEM CARACTERÍSTICAS SUSTENTÁVEIS

- Há política ambiental e social?

- Existe um código de conduta contra a exploração sexual?

- Tem alguma certificação ambiental ou social?

- As ações socioambientais realizadas pelo empreendimento são detalhadas e de fácil acesso ?
- Tem equipamentos que economizam água e energia?

- Há programa de reuso de toalhas e de roupa de cama?

- Oferece controle de energia por chave-cartão?

- Faz reciclagem de resíduos? n Faz compostagem de resíduos orgânicos?

- Existe um sistema de captação de água de chuva?

- Evita o uso de embalagens individuais de alimentos como manteiga, geleia e açúcar? n Disponibiliza bicicletas para hóspedes?

- Evita o uso de embalagens individuais de amenities com a utilização de distribuidores nos banheiros dos quartos?

- Privilegia e oferece itens da culinária local no cardápio?

- A estrutura é adequada para receber hóspedes com necessidades especiais?

- Apoia alguma ONG local? n Possui horta própria?

- Possui sistema de energia solar e/ou eólica?

Fonte: Planeta Sustentável 
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